sexta-feira, 24 de outubro de 2014

Um conto de Halloween

Era tarde (para um bebê) e estávamos na cama, coladinhos, tentando fazer o soninho chegar.
Arthur, agitado, estava atento a todos os barulhos do vizinho. E aqui, o prédio é velho, o piso range, as madeiras das paredes estalam e o pátio interno ecoa todas as portas que se fecham. Ele, então, perguntava a cada minuto:
- É o papai?
Não era. Eu sabia que não era. Mas o pequeno, não.
Ficou agitado, ansioso, atento. Foram umas quinze perguntas até que eu decidisse fazer um tour noturno pela casa, para mostrar ao filhote que não havia ninguém em casa e que os barulhos que ele escutava vinham dos vizinhos. Ele topou, pulou para o meu colo e assim fomos:
- Viu, filho? Aqui a cozinha toda apagada. E não tem ninguém. O papai ainda está no trabalho. Olha a sala, ninguém, tudo escuro. Somos só eu e você. Banheiro, quarto, armário. Viu? Ninguém. Agora, vamos dar tchau para a casa e vamos dormir.
Começamos pelo quarto dele:
- Tchau, brinquedos. Tchau, caixa de papelão. Tchau, janela.
Ele ria, divertindo-se.
- Tchau, sofá. Tchau, estante. Tchau, poltrona.
Chegamos à cozinha, último cômodo antes de entrarmos no quarto. Tudo escuro. Nós dois sozinhos. Tudo em silêncio.
- Tchau, geladeira. Tchau, fogão.
- Mamãe?
- Oi, filho?
- E praquele moço ali? A gente também pode dar tchau?
- Vamos dormir, Arthur. Vamos!

uahauahuahua [risada de bruxa]

terça-feira, 21 de outubro de 2014

Mamãe, a espertona.

- Aqui, filho, um franguinho. Come.
- Não.
- Cococó, cococó...
- Que isso, mãe?
- É o franguinho, filho, dizendo que quer entrar na sua boca.
(Ele tranca a boca. Pega o telefone de brinquedo.)
- Alô... aham... é...
- Quem é filho?
- Pera, eu tô ligando pro franguinho.
(Pausa dramática.)
- Alô, franguinho, eu tô ligando pra você não entrar na minha boca, não. Tá? Beijo, tchau.

E eu me achando a esperta.

terça-feira, 7 de outubro de 2014

A geladeira NÃÃÃOOOO!

Era bem tarde, umas duas, talvez três da manhã, quando a geladeira fez seu VUUUUUSHHHHH bem alto. A porta fechada não adiantou e parecia que um Boing tinha ligado as turbinas dentro da minha casa. Arthur, óbvio, acordou. Aliás, duas vezes na mesma madrugada, pelo mesmo motivo.
Decidimos, então, pedir que trocassem a geladeira.
Aqui, a responsabilidade de troca de equipamentos básicos da casa ou da cozinha é do senhorio. Ligamos, pois, para o nosso, que depois de tentar resolver o problema com manutenção e mandingas, veio substituir o avião por uma geladeira.
Isso foi hoje. Os rapazes da manutenção bateram à porta, trouxeram a geladeira nova, levaram a velha, varreram o chão e fizeram a realocação de tudo que estava dentro do avião refrigerado.
Eu estava satisfeita, quase feliz - daquelas felicidades prosaicas, sabem?
Filhote perguntou quem eram as pessoas e eu respondi. Quis saber por que estavam ali e eu disse. Ele, então, abriu um berreiro, sentido, de lágrimas gordas e quentes pingando na camisa, o rostinho vermelho com a emoção. Surpresa, abracei-o e indaguei o motivo do choro, da tristeza, ao que ele esclareceu:
- Eu não quero que levem a geladeira velha!
Consolei, expliquei, distraí, abracei, fiz tudo que estava a meu alcance. Mas ele ficou mesmo ressentido com a troca e precisei passar uma tarde toda revezando entre consolar e escutar muito choro por causa da geladeira velha.
Durma-se com um barulho desses (ou daquele).

quarta-feira, 1 de outubro de 2014

Seu, meu, nosso...

Arthur na rua conosco e encontramos, os três, nosso vizinho.
Conversa vai, conversa vem, despedimo-nos e vamos adiante.
Arthur, então, pergunta:
- Quem era?
- Nosso vizinho, filho, o Supratim.
- Hã?
- Supratim, filho, nosso vizinho.
- Hã?
- Aquele moço era o Supratim.
- Hã?
- Supratim, Arthur.
- E cadê o meu pratinho?